A nova lei de migrações da Espanha que entrou em vigor no dia 16 de agosto de 2022 é, sem dúvidas, uma boa notícia para os brasileiros, para a Espanha e para o mundo. O ponto de partida dessa reforma é o reconhecimento de que a regularização da imigração pode potencializar os aspectos positivos da mobilidade humana internacional, bem como minimizar as ineficiências e reduzir a economia informal que o modelo vigente fomenta, que causam elevados custos econômicos, sociais, humanos e de gestão pública. Em outras palavras, reconhece, por exemplo, que é ruim para a Espanha que estudantes estrangeiros qualificados e capacitados em suas universidades sejam impedidos de trabalhar na Espanha e/ou obrigados a retornar a seus países de origem levando consigo os conhecimentos adquiridos. Ou que áreas como a construção civil, hotelaria e de trabalhadores rurais permaneçam carentes de trabalhadores quando os estrangeiros que desejem viver na Espanha poderiam contribuir para preencher essas vagas e dinamizar a economia.
Essa reforma foi desenvolvida a partir de quatro enfoques:
O primeiro é o do mercado de trabalho, visando atender às suas necessidades atuais. Elementos como o cadastro de vagas de empregos, por exemplo, tem se mostrado de difícil preenchimento e precisava ser atualizado e dinamizado. Trabalhadores das áreas de hotelaria, construção civil e trabalhadores rurais, por exemplo, poderão mais facilmente sair de seus países já com emprego garantido.
O segundo é a percepção de que a imigração para fins de estudos não pode estar desconectada de alguma forma de trabalho que permita o estudante se sustentar durante o período de estudos e adentrar definitivamente ao mercado de trabalho ao final desse período. Aqueles que pretendam viver na Europa, poderão através de uma graduação ou pós-graduação dar os primeiros passos para migrar em caráter definitivo para Espanha, algo que até então era desestimulado.
O terceiro é facilitar o empreendimento por parte de estrangeiros, especialmente o de caráter inicial, reconhecendo a relevância do empreendedorismo e do autoemprego. Por fim, mas não menos importante, é a facilitação dos trâmites relacionados a imigração através da criação de uma nova unidade administrativa.
A mudança que talvez afete o maior número de brasileiros talvez seja em relação a possibilidade de trabalho pelo titular de visto de estudos. A legislação anterior proibia o trabalho do estudante como fonte de sustento ou para sua permanência, bem como não poderia ser levado em conta em procedimento de prorrogação de estadia. Essa vedação não existe mais. A nova regulamentação passa a permitir o trabalho de até 30 horas semanais, desde que a atividade seja compatível com o estudo (objeto principal do visto concedido). Além disso, após o término do curso o estudante poderá trabalhar na mesma área de seus estudos e, cumprindo alguns requisitos, obter posteriormente autorização de residência em caráter permanente.
A nova lei, no que se refere ao reagrupamento familiar, amplia o benefício de redução da renda comprovada para quando o reagrupante for descapacitado ou menor, ainda que filho de cônjuge/parceiro ou adotado.
No que se refere às possibilidades de trabalho na Espanha, o catálogo de “vagas de emprego de difícil ocupação”, de atualização trimestral, passa por uma reformulação administrativa. Espera-se que, assim, seja mais dinâmico e reflita melhor as áreas em que haja déficit de mão-de-obra.
Outro aspecto muito importante dessa reforma é que a renovação de autorização para residência e trabalho temporário ficou menos exigente, pois a nova lei exige que o imigrante tenha trabalhado ao menos 3 (três) meses por ano (em lugar dos 6 meses exigidos anteriormente). A novidade é que não se exige mais que exista um contrato de trabalho em vigor para a renovação do visto. A nova lei autoriza a renovação mesmo se o imigrante estiver desempregado, desde que o término do contrato de trabalho tenha ocorrido por culpa alheia ao trabalhador e que este esteja ativamente buscando emprego. E, ainda, a renovação da autorização de residência e trabalho passa de 2 anos para 4 anos.
Parece que o governo da Espanha percebeu que as migrações são um fenômeno complexo. Não é por facilitar a imigração regular que as pessoas deixarão seus lares, suas famílias e seus amigos para se aventurar no desconhecido. Mas para aqueles que, por qualquer motivo (estudo, trabalho, reunião familiar, dentre outros), decidam migrar para Espanha, a partir de agora haverá um caminho menos burocrático e com melhores possibilidades de se integrarem à sociedade espanhola, potencializando os aspectos positivos das migrações e minimizando os efeitos negativos da imigração irregular.
Se você pretende viver na Espanha, consulte um advogado especialista em direito internacional, preferencialmente que tenha escritório ou correspondentes na Espanha, pois cada situação tem suas características e condicionantes próprias que precisam, sempre, ser analisadas caso a caso.
André Luiz Siciliano
Siciliano Sociedade de Advogados